Ser amiga é doar-se mesmo quando não há o que dar ao outro. É perder horas com conversas em que só há o outro e você não existe. É dizer que está bem e logo perguntar como o outro está, para logo falar das dores daquele diante de você - que são o que realmente importa. É chorar por quem se ama. É sentir culpa após a decisão de colocar-se em primeiro lugar.
Não é isso?
Durante anos, achei que sim. Nem sabia que era esta a minha forma de pensar, agir e me exaurir. Só quando dei tilt e parei de ser a pessoa produtiva e funcional de sempre que percebi a forma nociva como muitas das minhas relações vinham funcionando. Sendo mais racional do que emotiva, dava aos outros o que tinha de melhor: minha escuta e meus pitacos. O tempo todo e a qualquer hora. Quando nem isto consegui e precisei que alguém fizesse o meu papel e deixasse para mim o único trabalho de ser vulnerável e ser ouvida, descobri que poucos estavam dispostos a tanto. Sabe quando mãe acostuma mal as suas crias e só percebe isso muito tarde? Foi o que fiz com muitos amigos sem notar.
O clique só veio quando, repetidamente e durante semanas, minha prima me mandava mensagens dizendo "preciso desabafar, quando vai estar em casa?" e ignorava completamente minhas respostas descrevendo meu cansaço. Notei que nenhuma mensagem vinha precedida por "bom dia" e que ao fim de suas infindáveis histórias com o namorado, jamais veio a pergunta "e você, como está?". Após o clique, realizei uma checagem simples que você consegue fazer aí no conforto da sua casa. Entrei em conversas com vários amigos e procurei as respostas para os momentos em que demonstrei alguma tristeza ou contei sobre algum evento difícil da minha vida. A maioria das respostas variou entre "que triste" e emojis, como o famoso":/" (talvez eu tenha desenvolvido uma certa aversão a emojis desde então). Também li minhas respostas longas e elaboradas. Poderiam ser doces ou duras, mas eu estava ali. Presente.
Não sou coitada. Permiti que isso acontecesse. O que você faz quando lhe oferecem algo bom? Você aceita. Dividi a situação com meus amigos da Psicologia, que já há algum tempo são os mais carinhosos e sensíveis que tenho. Fiquei impressionada com a quantidade de relatos mostrando que essa mania de dar sem receber é típica de psicólogo - a profissão rainha do auto-sacrifício. Provavelmente foi essa forma de ser que nos levou ao curso e o status do curso acaba agravando nossas relações desiguais. E, da mesma forma como ocorreu comigo, meus amigos também estavam ressentidos com a falta de cuidado dos seus próximos. É por isso que nos cuidamos tanto mutuamente. Apenas nós sabemos do quanto precisamos que reconheçam a humanidade que há em nós.
A reciprocidade tornou-se meu novo princípio de vida, o qual proteregei até morrer. Dar e receber na mesma medida. Ao amigo que me acolhe, oferto meu coração. Ao amigo que não me olha, o mesmo. Acredito que só tenhamos uma vida e que ela seja pouca para manter uma eterna postura de abnegação. Já sigo a ideia racionalmente e comportamentalmente, mas a culpa ainda vem quando não saio correndo para atender o outro. Mas tudo bem. Qualquer tempo levado para aprendermos a nos amar vale a pena.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigada por estar aqui,pessoa.